A Assembleia Legislativa do Ceará (ALCE) aprovou, nesta terça-feira, 21, um projeto de lei que exige que restaurantes, bares e outros estabelecimentos de alimentação fora do lar informem aos clientes os produtos comercializados que contêm substâncias que causam alergia. São elas: glúten, lactose, leite, peixe, amêndoas, corantes, castanhas, soja, ovo e crustáceos.
Nos cardápios, a informação deve ser inserida ao lado de cada produto, discriminando as substâncias utilizadas. Já no caso dos estabelecimentos que contam com a modalidade self-service, o aviso deve estar na etiqueta de identificação do alimento. A fiscalização do cumprimento da lei e aplicação de penalidades devem ser realizadas por órgãos de defesa do consumidor.
Aline Saraiva, presidente da Associação de Familiares e Amigos de Crianças com Alergias e Intolerâncias Alimentares (Afac), conta que a ideia do projeto de lei surgiu para que os alérgicos tivessem informação sobre o que comem fora de casa. “Quantas pessoas sofrem por consumir alimentos em bares e restaurantes e têm reações alérgicas gastrintestinais, até mesmo anafilaxia (reação aguda que pode levar à morte) ou edema de glote (inchaço na garganta)”, questiona. Ela explica que começou a militar pelo direito dos alérgicos há 11 anos, quando descobriu o diagnóstico do seu filho à proteína do leite de vaca. “Começamos a nos organizar como mães para lutarmos por direitos fundamentais à vida, à saúde e à alimentação”, defende, explicando que crianças e adultos com alergias podem ter problemas até mesmo com o vapor do alimento e é importante saber as substâncias que estão perto deles.
O deputado estadual Renato Roseno (Psol) explicou que a razão da proposição do projeto acontece devido ao crescimento do número de pessoas com alergia nas últimas décadas, o que considerou como um “grave problema” de saúde pública. “A questão central é tentar dar segurança aos pais de crianças com alergia. É preciso adaptar os estabelecimentos para esse público que está crescendo”, argumentou, apontando que leis similares já existem em outros estados brasileiros. De acordo com o portal especializado PEBMED, criado por médicos da Universidade Federal Fluminense, uma pesquisa conduzida com mais de 40 mil pessoas da população americana constatou que aproximadamente 10% dos entrevistados têm algum tipo de alergia alimentar, sendo 3% em pessoas adultas e entre 6 a 8% em crianças e adolescentes. Entre os adultos atingidos, quase a metade enfrentou pelo menos um episódio de alergia alimentar grave.
“Não vai trazer benefício algum”, aponta Associação de Bares e Restaurantes
O presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes no Ceará (Abrasel-CE), Taiene Righetto, disse que o projeto de lei aprovado na ALCE não deve trazer benefícios práticos para as pessoas alérgicas. Ele argumenta que a maior parte dos restaurantes carece de estrutura suficiente para garantir que os alimentos comercializados não possuem as substâncias que causam alergia. “Nós só tomamos ciência desta lei depois que foi aprovada, lamentamos que o setor não tenha sido chamado para discutir os pormenores”, afirma. Righetto prevê que os estabelecimentos irão colocar as informações apenas para se adequar à legislação, sem que possam ter precisão sobre a composição de cada alimento. “99,9% dos estabelecimentos aqui do Ceará vão escrever em boa parte dos alimentos que pode sim haver glúten, ovos, leite... Ninguém vai querer correr o risco”, aponta. Em relação a outras substâncias, como peixe e amêndoas, o presidente explica que já é uma prática comum nas cozinhas. “Amêndoas é um ingrediente sofisticado na cozinha, isso é realçado no cardápio”, argumenta. Para ele, a introdução de uma medida similar de forma ampla em bares e restaurantes não é viável. “A única chance é você ir a um restaurante especializado para isso. Não tem algo específico que a gente possa fazer para garantir que determinado alimento não cause alergia”, disse. Ele informou que a Abrasel está elaborando um parecer técnico do setor de nutrição para encaminhar essas informações às autoridades públicas.
Após saber da declaração do presidente, Aline Saraiva disse que pretende buscar a associação para estabelecer um diálogo. “Vamos sentar com ele e conversar. Queremos explicar e desmistificar a lei. Estamos abertos para compreendermos os dois lados”, argumenta. Com aprovação da ALCE, o texto será encaminhado para sanção do governador Camilo Santana (PT). A partir disso, os estabelecimentos terão 180 dias para se adequarem à legislação.
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